Loterias Municipais ganham força no Brasil e dividem opiniões

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Desde que o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, em 2020, que a exploração de loterias não é exclusividade da União, diversas cidades brasileiras passaram a enxergar nas apostas uma nova maneira de reforçar o caixa municipal. A medida, vista por muitos prefeitos como uma alternativa viável à alta dependência de repasses federais, já está em funcionamento em pelo menos sete municípios — e o número deve crescer.

Uma nova fonte de receita

O município de São Vicente, no litoral paulista, foi o primeiro a colocar a ideia em prática, ainda em 2022. Por meio da Lei Municipal nº 4.311/2022, criou uma loteria própria, com recursos destinados à saúde e educação. Outras cidades seguiram o exemplo.

Em Guarulhos (SP), Maceió (AL) e Cabo Frio (RJ), as loterias municipais foram aprovadas entre 2021 e 2023, com os fundos sendo aplicados em áreas como turismo, sustentabilidade e programas sociais. Mais recentemente, Canoas (RS) e Olímpia (SP) também instituíram suas loterias, ampliando o debate sobre o papel das prefeituras na regulação e exploração do jogo.

Em abril deste ano, Lagarto, em Sergipe, tornou-se o primeiro município do estado a aprovar uma loteria municipal. Segundo a prefeitura, os recursos arrecadados serão aplicados em saúde, educação, segurança pública e cultura.

Um campo em expansão

Segundo levantamento da Agência Brasil, a movimentação legal das loterias locais é sustentada pela decisão do STF (ADPF 492), que reconheceu que a União não tem monopólio exclusivo sobre a atividade. No entanto, a regulamentação ainda está em construção, o que gera insegurança para parte dos juristas.

Em Olímpia, por exemplo, o projeto de lei aprovado em maio de 2025 instituiu a “Olímpia + Sorte”, com foco em beneficiar áreas estratégicas como turismo, cultura e assistência social. Já Canoas criou a “Canoas Loto”, destinada a financiar ações da Secretaria Municipal da Saúde. “É uma inovação importante que pode gerar receita sem onerar o contribuinte”, disse o prefeito Jairo Jorge em coletiva à imprensa local.

Polêmica jurídica

A expansão das loterias municipais, no entanto, está longe de ser consenso. O Ministério da Fazenda já se manifestou diversas vezes, alertando que a legislação federal atual — especialmente a Lei nº 13.756/2018, atualizada pela Lei nº 14.790/2023 — não menciona os municípios entre os entes autorizados a explorar loterias. Para a pasta, apenas União, Estados e o Distrito Federal teriam essa prerrogativa.

Juristas ouvidos pela Folha de S.Paulo apontam que, sem uma regulação nacional clara, a proliferação de loterias locais pode gerar problemas de fiscalização, abrir espaço para irregularidades e comprometer a arrecadação da própria União.

Receita em jogo

O mercado brasileiro de apostas movimentou mais de R$ 21 bilhões em 2024, segundo a Loterias Caixa — e isso apenas considerando as modalidades oficiais. O número representa quase 20% do valor destinado ao Bolsa Família no mesmo ano.

“O problema é que, em nome da arrecadação, estamos normalizando a dependência de uma prática que, em muitos casos, prejudica os mais vulneráveis”, afirma a economista Nathália Rodrigues, pesquisadora da área de finanças públicas, em entrevista ao portal JOTA.

Caminho do meio?

Apesar dos questionamentos, prefeitos e defensores do modelo alegam que as loterias são uma forma legítima de buscar autonomia financeira. Argumentam também que, se forem bem geridas, com transparência e foco social, podem gerar impactos positivos reais.

Cidades como São Vicente, Canoas e Olímpia já começam a apresentar relatórios públicos com a destinação dos recursos. A expectativa, agora, é que o Congresso Nacional avance na regulamentação das loterias subnacionais, para que municípios possam atuar de forma legal e segura.

Fontes:

Supremo Tribunal Federal – ADPF 492 

Folha de S.Paulo – Reportagens sobre São Vicente, Olímpia e Canoas Agência Brasil – “Municípios começam a implantar loterias locais” (2024)

JOTA – “Cresce pressão por regulamentação das loterias municipais” (2025)

Diário Oficial de Lagarto (SE) – Lei Municipal nº 1.387/2025

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